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William Bittar – Corredor Transbrasil: Uma questão de Aritmética e bom senso

Após mais de uma década de atraso, no último sábado, 29 de março de 2024, evitando o dia 1º de abril, a Prefeitura da Cidade de Rio de Janeiro inaugurou o corredor TransBrasil do BRT com funcionamento limitado a poucas horas do dia, ao longo de grande parte da Avenida Brasil, como período de testes.

Para minimizar a propaganda negativa decorrente dos gigantescos congestionamentos, o funcionamento pleno foi antecipado para o fim se semana seguinte, sem qualquer iniciativa em relação ao fluxo dos demais veículos e a festa de caminhões circulando livremente em todas as faixas fora daquelas destinadas ao BRT.

Segundo a propaganda oficial, amplia a oferta de transporte de alta capacidade para passageiros, principalmente aqueles das zonas Norte e Oeste da capital e da Baixada Fluminense. Além disso, segundo a Prefeitura, o corredor poderá reduzir o tempo de viagem em até 50% no horário de pico. A primeira pergunta é: Para quem?

É difícil considerar este modal de alta capacidade, como já foi lamentavelmente observado em outros corredores. Além disso, se considerarmos o transporte ferroviário, não há possibilidades de comparação quantitativa. Acrescente-se que os trens conduzem diretamente à região central da capital, permitindo uma integração muito mais rápida e eficiente com metrô, VLT e linhas de ônibus.

O investimento efetivo na qualidade das ferrovias e seus vagões não é nenhuma novidade, há muito defendida pelos especialistas em transporte de massa, com ocorreu em um curto período há alguns anos, mas o sistema se deteriorou.

Algumas respostas se fazem necessárias para justificar o tempo e os custos desse empreendimento. Por quase uma década, seríssimos problemas diários e viários e todas suas consequências assolaram os diversos tipos de usuários daquela avenida considerada “via expressa”. Na prática, mais parece uma simples rua local sempre congestionada, sem qualquer intervenção do poder público para diminuir os inconvenientes crescentes.

Desde o início das obras intermináveis, com sucessivas promessas não cumpridas de conclusão, muitos deixaram de utilizá-la, optando por outros caminhos, salvo extrema necessidade, assim como o fiz por falta de segurança, bolsões d’água durante e após temporais, a insuportável morosidade no fluxo do trânsito e outros tantos problemas recorrentes. Entre outras consequências, o censo do IBGE revelou que seu entorno imediato perdeu quase 33 mil moradores nos últimos 12 anos.

A Avenida Brasil, inaugurada na década de 1940, corta 26 bairros da cidade, principalmente regiões de baixa renda e, ainda segundo a prefeitura, a inauguração desse novo corredor de transporte rodoviário poderá facilitar o deslocamento desses usuários, nem sempre às margens da via. Portanto, será necessário utilizar linhas de ônibus acessórias, com denominações rebuscadas, para promover a ligação com o corredor principal, prejudicando o fluxo interno de alguns desses bairros.

A “Avenida” Brasil, passagem para milhares de passantes diários, pode ser considerada a principal “via expressa” da cidade.  Essas pessoas utilizam um transporte rodoviário de péssima qualidade para acessar suas atividades, principalmente na região Central e adjacências.  Esse público pode ser facilmente quantificado e qualificado, considerando seus locais de origem, destino, horários, redimensionando as linhas de ônibus que poderão ser substituídas pelo BRT.

No entanto, dificilmente o usuário dos trens trocará sua opção de modal, pois já conta com itinerário e horários definidos. Para estes, torna-se indispensável o investimento imediato nas ferrovias para tornar digno o acesso e retorno de suas atividades diárias.

Aqueles que utilizam veículos particulares, carros de aplicativos ou vans serão atirados em intermináveis congestionamentos, como já foram registrados na primeira semana de funcionamento do novo corredor, chegando à marca recorde de 180 quilômetros na quarta-feira, 03 de abril de 2024, sob alegação de “diversos incidentes concomitantes”. Registre-se que os proprietários desses veículos são responsáveis pela arrecadação do IPVA (cerca de 3,5 bilhões), dividido igualmente entre estado e município e estão recebendo tratamento diferenciado, pois mesmo fora dos horários determinados pelo poder público não podem utilizar uma faixa vazia.

Houve alguma pesquisa sobre os hábitos desses usuários? Estariam eles dispostos a trocar o conforto de seus veículos por vagões superlotados observados nos corredores mais antigos?  O corredor Transbrasil ser mostra acessível em relação aos seus locais de moradia e destino? E quanto às baldeações desde o Terminal Gentileza, implantado num dos maiores pontos nodais do trânsito carioca?

Outro fator muito conhecido é a circulação de caminhões por toda a cidade. Em tempos pré-pandemia havia horários estabelecidos inclusive para carga e descarga e utilização da Linha Amarela, conforme algumas placas ainda sinalizam.

Muitas iniciativas em relação ao trânsito foram revistas, mas os caminhões foram “esquecidos” oportunamente, conforme informou a própria prefeitura após questionamento por escrito, que não havia revogado nada em relação a esses veículos.

Enquanto isso, a prefeitura anuncia o pleno funcionamento de seus radares, multando aqueles que invadem as pistas exclusivas vazias fora dos horários de funcionamento dos articulados. Em gestão anterior do mesmo prefeito, seu secretário de transportes na ocasião comemorava a arrecadação através de multas aplicadas por radares mal aferidos por toda a cidade, numa debochada atitude em relação ao cidadão-contribuinte. A imprensa noticiou, em 2021, que aquele secretário fora incorporado ao quadro administrativo nessa nova gestão, em alguma assessoria mais discreta.

Após uma pesquisa detalhada que, se foi realizada, ainda não foi divulgada, surgiria o quantitativo definidor de fluxos e seus horários de pico. Com isso, seria possível prever que quando duas faixas de rolamento são retiradas de uma “via expressa”, ônibus de linha continuam a circular pela pista lateral, caminhões circulam por onde querem, sem qualquer sanção, como também ocorre na Linha Amarela, o congestionamento se tornaria inevitável, aumentando consumo de combustível, poluição atmosférica, aumento do ruído ambiental, desgaste psicológico dos usuários-contribuintes. Uma questão aritmética previsível, recomendada pelo bom senso, diferente de experiências empíricas de erro e acerto, realizadas utilizando a população como cobaia.

Talvez a proximidade de eleições municipais acelere algumas decisões que deveriam ser efetivamente planejadas, pois uma década é mais do que suficiente para subsidiar decisões através de profissionais competentes em suas respectivas secretarias, não apenas porta-vozes defensores das decisões oficiais.

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