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Quem ganha com meta de inflação maior?

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Mantido o cronograma dos últimos anos, em junho o CMN (Conselho Monetário Nacional) definirá as metas de inflação dos próximos três anos. A decisão virá debaixo de um debate técnico público sobre a elevação das metas, uma mudança que tenderia a ser contraproducente para o país.

Em 2016, o CMN iniciou uma convergência gradual e longa da meta de inflação de três anos à frente para o patamar observado nas demais economias emergentes. Além de um compromisso com reformas que impactariam positivamente o crescimento potencial do país, pretendia-se a convergência das expectativas inflacionárias a longo prazo, o que de fato ocorreu.

A partir de 2019, as metas de inflação (de 4,5%) foram sendo reduzidas em 0,25 ponto percentual a cada ano, até chegar a 3% em 2024, ali permanecendo. Essa convergência leva a meta do Brasil ao mesmo patamar de pares latino-americanos, como Chile, México e Colômbia.

Mas um debate recente surgiu sobre a adequação de um alvo central de 3% à economia brasileira. Voltar a subir a meta representaria, assim, a interrupção dessa convergência e a aceitação de níveis de preços mais altos. De imediato, mais inflação favorece a arrecadação pública e aumenta o rendimento das aplicações em renda fixa, mas reduz o poder de compra da população, sobretudo de quem compromete maior parcela da renda com consumo.

Um dos principais argumentos dos que defendem uma elevação da meta é que, além de a inflação ter ficado acima do estabelecido nos últimos anos, as expectativas de médio prazo têm subido, o que poderia ser um sinal de que os agentes não acreditam em seu cumprimento. Sendo assim, alguns argumentam que seria melhor elevar a meta para torná-la crível novamente.

Importante lembrar que os choques inflacionários ocorridos desde 2021 resultaram de eventos extraordinários, como a pandemia e a Guerra da Ucrânia, que desorganizaram padrões de consumo e reduziram a oferta de bens e serviços temporariamente. Esses choques não são previsíveis, e o instrumento da taxa de juros consegue apenas atuar, com alguma defasagem, sobre os seus efeitos secundários. Tal enfrentamento vem sendo feito pelos bancos centrais com sucesso.

Além disso, os estímulos adotados pelos governos para atenuar esses choques contribuíram para relativo aquecimento da economia e do mercado de trabalho, ajudando a pressionar a inflação. Portanto, pelo canal das expectativas, subir a meta em um momento do ciclo que a economia ainda tem sinais de aquecimento pode gerar mais inflação.

No caso do Brasil, parte da alta das expectativas de inflação de médio prazo está relacionada aos sinais provenientes da política fiscal (mais estímulos). Ou seja, trata-se de algo que não será solucionado alterando-se as metas.

A mudança seria um sinal de enfraquecimento ou de desistência do caminho de solução estrutural do problema que alimenta as expectativas inflacionárias de médio e longo prazo, qual seja, a falta de reformas capazes de levar o Brasil a crescer mais e a reequilibrar as contas públicas. Contudo, o governo tem sinalizado uma ampla reforma tributária —tanto de bens e serviços quanto da renda e patrimônio—, a adoção de um novo marco fiscal capaz de endereçar a consolidação das contas públicas e o avanço das pautas de integração comercial com o resto do mundo, além de ter um compromisso assentado de responsabilidade fiscal, tal como já fizera no passado.

A elevação da meta sancionaria um juro neutro —ou seja, aquele que não contrai nem acelera a inflação— maior no Brasil, compatível com o enfraquecimento da agenda de reformas e com dificuldades mais severas do ajuste fiscal. Durante a plena vigência do teto de gastos e com a aprovação da reforma da Previdência, o juro real neutro caiu para cerca de 3%, o que viabilizou uma taxa Selic neutra em torno de 6% a 7% em termos nominais.

Com a paralisação das reformas e os subsequentes furos no teto, o juro neutro vem se aproximando de 5% ao ano, segundo nossas estimativas. Mediante sinalização de maior leniência com a inflação, poderá subir rapidamente a 6%.Haveria algum benefício, então, em mudar a meta?

Os que são a favor acreditam que isso poderia facilitar a redução da taxa Selic pelo Banco Central e assim atenuar o impacto sobre o crescimento. E, ainda, que as expectativas inflacionárias iriam se reancorar na nova meta (entre 4% e 4,5%).

A evidência empírica, contudo, mostra que a taxa de juros não tem a capacidade de gerar crescimento; ela apenas é capaz de suavizar os ciclos de curto prazo. Então, ainda que a mudança da meta pudesse gerar a queda imediata da Selic, estimulando recuperação cíclica mais rápida, isso viria ao custo de uma inflação permanentemente mais alta.

O único fator que pode levar o Brasil a crescer mais, sem pressões inflacionárias, é o aumento da confiança em um ambiente de negócios mais seguro, profícuo, previsível e menos dependente de estímulos artificiais, o que fomenta decisões de consumir, inovar e investir.

Se o Brasil avançar nos consensos políticos para aprovar as reformas necessárias, naturalmente as expectativas de inflação de médio e longo prazo voltarão a se ancorar. Os prêmios de risco se diluirão, e o BC terá condições de iniciar o ciclo de redução da Selic.

O único benefício de buscar um equilíbrio macroeconômico com inflação mais alta seria contar com um imposto inflacionário para ajudar a conter parte da expansão da dívida pública. Algo que vivemos muito recentemente, depois dos choques da pandemia, o que custou forte perda de poder aquisitivo e muito sofrimento justamente para aqueles que mais precisam do Estado (a cesta básica subiu 58% nesse período).

Mediante a lenta, mas crível, convergência inflacionária global, trata-se de algo que irá afastar o Brasil de um dos requisitos mais básicos da atração de investimentos, ao reconduzi-lo para um contexto inflacionário persistente. Trata-se de um lugar muito difícil e custoso de sair e que intensifica a desigualdade e a instabilidade social.


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