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Marçal 'fala a real' e apoio de Bolsonaro a Nunes não importa, dizem eleitores

Pablo Marçal cresce tanto por não ser “mais do mesmo” e soar mais autêntico do que os adversários, dizem eleitores do candidato do PRTB a prefeito de São Paulo.

São pessoas decepcionadas com o que veem como casta política desinteressada no povo e mais atenta às regiões nobres da capital paulista.

A cabeleireira Maria da Cruz, 39, mãe solo de quatro crianças, é a que melhor encarna essa frustração.

Demora em média duas horas e meia para ir do M’Boi Mirim (zona sul paulistana) até o salão onde trabalha, no Itaim Bibi (zona oeste). Reclama da merenda na rede de ensino pública. “As crianças estão comendo arroz, feijão e ovo. Gente, isso elas comem em casa. Antes tinha mais lanche, bolo, sucos, achocolatado, sabe?”

A falta de segurança também a atormenta. A creche da caçula já foi roubada oito vezes, diz. “Vi no Pablo uma esperança de mudança para a periferia. Todos [os prefeitos] que entram só pioram a situação.”

“Muito de TikTok, Instagram, Facebook”, Maria passou a prestar mais atenção em Marçal após a cadeirada que ele levou de José Luiz Datena (PSDB) num debate. Gostou do que viu. “Ele não mede as palavras. Chega e fala a real, entendeu? E os outros… Tipo, ficam tentando amenizar as coisas. Acho ele muito autêntico.”

A Folha convidou quatro eleitores que votarão em Marçal no domingo (6) para uma conversa em sua sede. Impressões sobre comunismo e entusiasmo com a promessa de criar dois milhões de empregos fizeram parte deste cardápio eleitoral.

Antissistema

Fora Maria, que optou por Lula em 2022 e “se arrepende mil vezes”, por achar que tudo piorou na gestão petista, todos ali votaram em Jair Bolsonaro (PL). Nem por isso vão segui-lo cegamente no endosso a Ricardo Nunes (MDB).

“Não sou ‘aonde Bolsonaro for, eu vou’”, diz o advogado e contador Agleilson Rodrigues, 41.

Ronie Maurício, 47, conta que votou duas vezes no ex-presidente. “Mas não sou um bolsonarista. Não, não. Não tenho partido. Política é uma coisa séria, não é um time de futebol. A gente tem que ver os interesses da região, não da pessoa que está lá. Bolsonaro apoia o Nunes. Não é por isso que vou apoiar”, diz ele, que se aposentou após sofrer um acidente de moto e hoje ajuda a esposa numa confecção no Brás.

O pedreiro Gerson Paulo Rocha, 46, até acha o prefeito “uma boa pessoa”, da qual “o eleitor do Marçal não tem muito do que reclamar”. O autodenominado ex-coach, contudo, conquistou o baiano que vive há 30 anos em São Paulo e “veio de dificuldades que não desejo para ninguém”. “Como gestor, um cara explosivo na área de investimento, aí é Marçal.”

Comunismo e meritocracia

Evocado como espantalho eleitoral por Marçal, que acusa adversários de integrarem um “consórcio comunista”, o conceito é explicado de formas distintas pelo grupo.

Paulo saca a seguinte analogia: se alguém faz a mesma função que um colega numa obra e ganha mais por isso, “então, estou sendo comunista”. A explicação, se formos simplificar essa ideologia, na verdade é a contrária: todo mundo recebendo quantia igual, sem distinção social e propriedade privada.

Agleilson critica um sistema avesso à meritocracia. “O comunismo, pra mim, vem do comum. E não concordo que seja tudo comum. O que é meu é do meu mérito, o que é do outro é do mérito dele. Cada um é recompensado conforme o seu desempenho.”

Regimes comunistas, como os da China e da Coreia do Norte, limitam cidadãos, diz. Mas muitos eleitores nem sequer estão atentos a etiquetas ideológicas, segundo ele.

O advogado participou do projeto assistencialista de Marçal em Angola e tenta seguir os passos do influenciador. Tem sua própria conta verificada no Instagram, com 2.200 seguidores.

“A maioria das pessoas, assim como eu, vem da simplicidade, de uma coisa do sofrimento, de uma roça, da favela. Então elas às vezes não sabem o que é o comunismo, o que é a direita, a esquerda.”

Polêmicas

Maria achou “um pouco machista” Marçal afirmar a Tabata Amaral (PSB), num debate, que “mulher não vota em mulher” porque “mulher é inteligente” —ele depois disse que foi mal interpretado e creditou o auê em torno da fala à “chatice esquerdista”.

Ronie classifica a declaração como “infeliz”, e Paulo lembra que Marçal tem uma mulher de vice, a PM Antônia de Jesus. Foi uma “força de expressão” para provocar Tabata, acredita.

Casos antigos, como a condenação por participar de um golpe que desviava dinheiro de contas bancárias, na opinião da mesa não desabonam Marçal, que tinha 18 anos na época. “Uma conduta de um moleque de 20 anos atrás. Eu 20 anos atrás, meu amigo, se contar o que fiz…”, diz Agleilson. Para Paulo, analisar o episódio é “um papel da polícia, não é da sociedade”. “Quem somos nós para julgar?”

Outro ponto usado contra Marçal que Agleilson vê como birra: a expedição ao Pico dos Marins que terminou com bombeiros resgatando uma trupe liderada pelo então coach. Todo mundo ali era “maior de idade” disposto a se desafiar. “Meu amigo, vamos correr risco.”

Imprensa

A turma enxerga dois pesos e duas medidas no trato com Marçal. Vide o tom que, para eles, teria prevalecido, de que o candidato do PRTB mereceu a agressão de Datena por tumultuar os debates.

Diz Paulo: “Se o Boulos leva aquela cadeirada, o Datena estava preso”. Daí ele achar que a imprensa foi parcial ao abordar o caso. Agleilson vai além: e se o alvo tivesse sido uma mulher? “Pronto, aí acabaria.”

Maria, Paulo e Agleilson dizem que a mídia, de forma geral, favorece Boulos. Ronie destoa aqui. “O jornalista tem que buscar informações e ele vai ter que perguntar. A pessoa pode se sentir incomodada por ser perguntada daquilo que ele não quer falar”, mas isso não é sinônimo de perseguição, diz.

Propostas

O quarteto destaca a educação como área sensível e curte a proposta de incluir disciplinas sobre finanças e empreendedorismo no currículo escolar.

Paulo também aprova o plano de construir um prédio de um quilômetro de altura na cidade. “Nós precisamos ter um macro, alguma coisa que realmente nos represente. Somos um povo tão guerreiro. E a gente vê Dubai fazer prédio dentro d’água.”

Maria cita a promessa de criar 2 milhões de empregos, mas a construção quilométrica não enche seus olhos. “Tem aquele prédio bonito, e a periferia continua do mesmo jeito que está, não adianta.”

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