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Eleições britânicas confirmam tendência global antigovernista

O Partido Trabalhista deu uma surra nos conservadores e venceu as eleições britânicas por uma margem histórica, quase igual à goleada de Tony Blair em 1997. Ganharam 412 cadeiras no parlamento, 214 a mais do que na última eleição. É muita coisa.

Foi o fim de um ciclo de governos conservadores que começou com políticas de austeridade implementadas cedo demais após a crise do euro, passou pelo desastre do brexit e terminou com as menores taxas de crescimento do mundo desenvolvido. Não, não foi um sucesso.

Talvez seja possível analisar a derrota dos conservadores como resultado das contradições originais do brexit.

Os setores da elite que apoiaram o brexit esperavam um Reino Unido muito mais integrado globalmente —Londres seria a “Singapura sobre o rio Thames”.

Mesmo se o público britânico estivesse disposto a desistir de décadas de conquistas sociais para se adequar ao modelo asiático, e não está, a globalização está em recuo.

Londres, visceralmente antibrexit, não virou Singapura, mas os tories levaram uma surra em toda a região da capital. Bastiões do liberalismo como a revista The Economist e o jornal Financial Times declararam apoio aos trabalhistas esse ano.

Por outro lado, os setores mais radicais que votaram pelo brexit dessa vez seguiram o Partido da Reforma, da direita populista. Pelo sistema distrital britânico, o Reforma ganhou apenas quatro cadeiras no Parlamento, mesmo tendo obtido uma votação expressiva.

Isso acontece quando o partido fica em segundo em muitos distritos. Os conservadores têm razões para temer que, no futuro, a direita radical ocupe seu espaço no sistema político britânico.

Não há dúvida de que a divisão da direita ajudou os trabalhistas a vencer em muitos distritos. De maneira análoga, no outro lado do espectro político, Marine Le Pen conta com a divisão entre centristas e esquerdistas para vencer na França.

O que a eleição britânica significa dentro do quadro geral da política internacional? Seria tentador dizer que é o refluxo da ascensão do populismo de direita, que teve no brexit um de seus momentos decisivos; mas talvez tenha sido o começo da substituição dos conservadores pela direita radical na liderança da direita britânica.

Ainda não é possível cravar esse diagnóstico, mas uma coisa é clara: a derrota dos conservadores britânicos mostra como é difícil ser governo no mundo pós-Covid, de crescimento baixo e juros altos.

A inflação pode estar mais baixa, mas isso não quer dizer que os preços da comida tenham caído desde a grande escalada pós-Covid: só quer dizer que sobem mais devagar. Continua difícil comprar uma casa no mundo desenvolvido e continua difícil comprar comida nos países pobres.

As eleições britânicas confirmaram a tendência global anti-incumbente, contrária a candidatos governistas. Bolsonaro e Trump perderam a reeleição, Modi teve muito mais dificuldades nas eleições indianas do que se esperava, Biden e Macron podem perder em breve.

Não sabemos, inclusive, se a nova maioria trabalhista será estável. Isso dependerá do quanto o novo primeiro-ministro, Keir Starmer, conseguirá entregar resultados em um cenário muito pior do que aquele em que Tony Blair governou. Lembra um pouco o desafio de Lula 2024 em comparação com Lula de vinte anos atrás.


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