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Eleição no Recife vira disputa entre forró bolsonarista e brega funk do prefeito

Na corrida eleitoral à Prefeitura do Recife, os candidatos João Campos (PSB), 30, que tenta a reeleição, e Gilson Machado (PL), 56, ex-ministro do Turismo do governo Bolsonaro, expõem nas redes sociais duas visões distintas sobre a capital pernambucana, num duelo de ritmos.

Campos se alia ao brega funk, usado em jingles de sua campanha, e Machado ressalta o seu apelido de sanfoneiro, num aceno ao forró eletrônico dos anos 1990.

A música demarca uma oposição entre os dois candidatos. De um lado, o atual prefeito tenta enfatizar jovialidade e progressismo, unindo-se ao gênero musical da vez. Do outro, o adversário busca resgatar uma imagem do passado da cidade, para mobilizar o eleitorado conservador.

A pesquisa Datafolha mais recente, publicada nesta semana, mostra o prefeito com 76% das intenções de voto. Já Machado tem 6% e está empatado tecnicamente com Daniel Coelho (PSD), com a preferência de 5% do eleitorado.

No início deste mês, Campos divulgou nas redes sociais o jingle “Meu Prefeito” em ritmo de brega funk. “O cara que faz/ o que ninguém fez/ tô com meu prefeito/ é João outra vez”, diz o refrão.

Sua relação com o gênero vem desde a sua primeira candidatura, em 2020. Campos tem 2,4 milhões de seguidores no Instagram, onde publica vídeos com o ritmo preferido.

“João é a cara do Recife, Recife é a cara de João” é o título de um deles. Na canção, um poeta aparece declamando versos em louvor ao político que “faz passinho e pula Carnaval”, em menção ao episódio em que o prefeito descoloriu o cabelo e dançou brega funk usando óculos estilo Juliet no palco do Marco Zero, em fevereiro.

Ele repetiu a performance outras vezes desde então. Em junho, gravou um vídeo dançando em um canteiro de obras, ao entregar uma escadaria em Nova Descoberta, na zona norte da cidade.

O aparato de marketing que ronda a sua campanha, no entanto, é alvo de críticas dos opositores. Não à toa, Coelho adotou como lema eleitoral a frase “Recife sem filtros”, em reação ao sucesso de Campos na internet.

Em 2023, a prefeitura gastou R$ 1,3 milhão num contrato com a agência Hermanos para a gestão das redes do político. Aliados admitem que existe a possibilidade de a empresa trabalhar na campanha —a Folha não conseguiu contato com a agência.

Em paralelo, Machado propaga em suas postagens no Instagram, onde tem 487 mil seguidores, o verde-amarelo das manifestações bolsonaristas. Em várias fotos, o próprio Jair Bolsonaro (PL) aparece com a camiseta da seleção brasileira, na companhia do candidato.

Conhecido pelo epíteto “o sanfoneiro”, o candidato do PL explora nas publicações a imagem de seu instrumento. “O jingle dele vai ser um forrozinho galope, mas ele, enquanto candidato, compôs um jingle para ele mesmo”, diz Joman Barbosa, marqueteiro da campanha.

A nova composição de Machado será revelada na próxima semana. Pesquisas internas da campanha, diz Barbosa, mostram que o eleitorado se lembra do ex-ministro pela sanfona.

O candidato ficou conhecido por tocar o instrumento nas lives de Bolsonaro. Nos anos 1990, ele criou o grupo Forró da Brucelose, termo que designa uma doença que provoca o aborto em vacas.

Pesquisador da cena musical pernambucana e produtor do podcast Igoarias Musicais, Igor Marques diz que a banda de Machado não está entre as principais de sua época, mesmo com os sucessos “Sede de Te Amar” e “Te Amo Demais”. Ele afirma que o candidato tenta a simpatia do eleitorado mais velho e conservador, mas a estratégia pode representar um erro.

“Parece querer evocar um Recife mais tradicional, do passado, mas o forró tem mais a ver com Pernambuco do que com o Recife”, diz Marques. “O mais natural seria ele escolher o frevo ou uma MPB, evocada por Alceu Valença.”

Segundo o pesquisador, embora mostre a adesão ao brega funk, Campos não criou políticas públicas para essa cena. Aliados dizem, porém, que nas próximas semanas o apoio de um grupo de MCs de brega funk deverá ser anunciado.

O gênero surgiu nas periferias do Recife em 2010 e se tornou um estilo de comportamento, com marcas de roupas e acessórios, como aqueles usados pelo prefeito, e perfis de humor nas redes sociais dedicados ao assunto.

Na esteira da música, Campos protagoniza os memes do momento em suas mídias. “O brega está sendo absorvido pela política, e João Campos tenta passar uma imagem de político descolado”, diz Marques.

O prefeito é filho de Eduardo Campos e bisneto de Miguel Arraes, que foram governadores de Pernambuco. “O eleitor já precificou isso [a imagem de herdeiro político], mas entende que João é uma figura contemporânea”, afirma o professor de marketing político da ESPM Marcelo Vitorino.

“Entendo que ele usou essa linguagem jovem até para a juventude dele não ser uma questão durante a campanha.”

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