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Conselho de Ética ignora falhas e aprova parecer de Boulos que livra Janones

Em sessão tumultuada e que terminou em embate físico entre deputados, o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados ignorou falhas e aprovou nesta quarta-feira (5) parecer de Guilherme Boulos (PSOL-SP), arquivando a representação contra André Janones (Avante-MG) por suspeita da prática de “rachadinha”.

Foram 12 votos a favor e 5 contra o relatório de Boulos, que defendia o arquivamento do caso.

Tanto Boulos quanto Janones são aliados do presidente Lula (PT). O primeiro é seu candidato à Prefeitura de São Paulo. O segundo integrou a linha de frente de sua campanha eleitoral digital em 2022.

A sessão foi marcada pela presença em massa de parlamentares bolsonaristas, mesmo não integrantes da sessão, que discursaram em sequência contra Janones e Boulos, sempre fazendo referência à pré-candidatura do segundo em São Paulo.

Estava presente, por exemplo, o coach Pablo Marçal (PRTB), que também se lançou pré-candidato à prefeitura paulistana. Ele não é deputado, mas foi autorizado a participar da sessão pelo presidente do Conselho de Ética, Leur Lomanto (União Brasil-BA).

Marçal e Boulos chegaram a bater boca durante a sessão após o deputado do PSOL afirmar que a tropa bolsonarista levou para a sessão até um “coach picareta” e que era para ele não vender sua candidatura ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) —com até 9% nas pesquisas de intenção de votos, a candidatura de Marçal é vista como um obstáculo ao prefeito paulistano por dividir o eleitorado de direita.

Em sua fala, Boulos repetiu não ter analisado o mérito do caso e afirmou que, se a Justiça entender que Janones cometeu rachadinha, ele tem que ser punido.

O deputado do Avante reafirmou não ter cometido a prática.

Nikolas Ferreira (PL-MG) se sentou logo atrás dele e fez longo discurso cara a cara com o deputado do Avante, seu adversário. “Ele [Janones] é o maior divulgador de mentiras do Brasil e eu sou uma das vítimas, ele divulgou um ator pornô gay que disse que era eu durante a campanha”, disse.

O PL é o mesmo partido de Jair Bolsonaro, cujo sobrenome está vinculado a diversos escândalos de “rachadinha”.

O placar mostrou que todos os partidos de centro e direita que fazem parte do governo Lula votaram pelo arquivamento. O PL votou pelo prosseguimento do processo, à exceção de Junior Lourenço (PL-MA), que seguiu a maioria.

As suspeitas contra Janones vieram a público após o site Metrópoles revelar áudio de 2019 em que ele, em seu primeiro mandato como deputado, informou a assessores que eles teriam que devolver parte dos salários para ajudar a recompor seu patrimônio dilapidado na fracassada eleição de 2016.

A Folha também obteve o áudio. Dois ex-assessores do deputado federal afirmaram à reportagem que o parlamentar promoveu o esquema de “rachadinha” em seu gabinete.

“Não é [corrupção], porque o ‘devolver salário’ você manda na minha conta e eu faço o que quiser. São simplesmente algumas pessoas que eu confio e que participaram comigo em 2016 [nas eleições municipais, em que ele saiu derrotado], e que eu acho que elas entendem que realmente o meu patrimônio foi todo dilapidado. Eu perdi uma casa de R$ 380 mil, um carro, uma poupança de R$ 200 mil e uma previdência de R$ 70 mil. Eu acho justo que essas pessoas também hoje participem comigo dessa reconstrução disso”, afirmou o parlamentar na gravação.

Em seu voto, Boulos deturpou uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) e usou como argumento uma afirmação do próprio Janones para sugerir o arquivamento do processo.

Segundo o deputado do PSOL, o deputado do Avante não era parlamentar no dia em que foi gravado, portanto não se pode falar em quebra de decoro parlamentar.

Ao contrário do que diz Boulos em seu voto, o STF não disse que as suspeitas de rachadinha se referem a 2016, mas sim a 2019, já no exercício do mandato. A íntegra do áudio da reunião em que Janones foi gravado também indica que ele já havia tomado posse.

No áudio, ele reclama com assessores que vários colegas já haviam apresentado projetos de lei e ele não —só um deputado pode apresentar projeto— e que estaria também desamparado sobre como proceder na sessão plenária que ocorreria naquela tarde.

“Cês viram aí nas notícias no Facebook, já tem uma porrada de deputado que já apresentou o projeto de lei ontem. Ontem tinha uma fila de cem deputados apresentando projeto de lei. Eu sequer sabia disso. Por que eu não sabia? Porque eu não contratei nenhum especialista em técnica legislativa”, diz o parlamentar, em um contexto em que tentava convencer a sua equipe de Minas Gerais a se mudar ou ir com frequência a Brasília.

A tese apresentada por Boulos para tentar livrar Janones também contraria o que ele próprio e o PSOL adotaram em pedidos de cassação que protocolaram contra adversários —contra Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado de mandar matar Marielle Franco (PSOL-RJ), Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que foi investigado por suspeita de “rachadinha”, e quatro deputados do PL que teriam estimulado as depredações de 8 de janeiro.

Em todos esses casos, os crimes dos quais eles são ou eram acusados dizem respeito a período anterior ao exercício do mandato no Congresso Nacional.

Janones nega que tenha promovido “rachadinha”, afirmando que pediu contribuições a amigos, que se tornariam seus assessores, para quitar dívidas que ele e esses auxiliares assumiram em conjunto nas eleições de 2016.

Disse ainda que não considera sua atitude ilícita e que, de qualquer forma, a devolução de parte dos salários dos assessores acabou não ocorrendo por orientação jurídica que recebeu.

Ao final da sessão no Conselho de Ética, bolsonaristas foram para cima de Janones com xingamentos, e a situação terminou em embate físico e empurra-empurra, com ameaça de agressão física entre Nikolas e o deputado do Avante.

A troca de ofensas e empurrões prosseguiu pelos corredores da Câmara após a saída de Janones da sala onde ocorreu a reunião. Boulos deixou a sessão antes que o resultado fosse proferido e não estava na sala na hora da confusão.


Veja como cada deputado do Conselho votou:

A favor da continuidade do processo:

  • Gilberto Silva (PL-PB)
  • Delegado Ramagem (PL-RJ)
  • Domingos Sávio (PL-MG)
  • Marcos Pollon (PL-MS)
  • Bruno Ganem (PODE-SP)

Pelo arquivamento do caso:

  • Ana Paula Lima (PT-SC)
  • Jack Rocha (PT-ES)
  • Jilmar Tatto (PT-SP)
  • Ricardo Maia (MDB-BA)
  • João Leão (PP-BA)
  • Julio Arcoverde (PP-PI)
  • Paulo Magalhães (PSD-BA)
  • Sidney Leite (PSD-AM)
  • Albuquerque (Republicanos-RR)
  • Márcio Marinho ( Republicanos -BA)
  • Junior Lourenço (PL-MA)
  • Guilherme Boulos (PSOL-SP)

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