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Como líderes radicais lidam com os sistemas partidários nas democracias atuais?

Jordan Bardella condicionou sua entronização como primeiro-ministro à obtenção de uma maioria absoluta por seu partido no Parlamento francês. Ao que Marine Le Pen abrandou afirmando que apenas formaria uma coalizão se pudesse “governar”. Lideranças radicais rejeitam coalizões e tem arroubos majoritários. Apresentam-se como líderes majoritários, mesmo quando não o são. E formar coalizões significa barganhar, que é a essência da atividade parlamentar.

A França utiliza distritos uninominais e o número efetivo de partidos políticos (NEPP) é maior (3.7) que no Reino Unido (2.3) ou EUA (2.0) devido à existência de segundo turno. (NEPP é uma métrica que leva em conta a dispersão do número de cadeiras entre os partidos). Trata-se de um multipartidarismo mínimo onde ainda há incentivos para uma competição pela mediana de preferências do eleitorado. Isto cria fortes incentivos para Le Pen desradicalizar seu programa. O que vem fazendo. Idem Giorgia Meloni. Tais incentivos são universais: veja-se a trajetória de Keir Starmer, que levou seu rival à esquerda, Jeremy Corbyn, a ser expulso do partido trabalhista.

Mas sim, o multipartidarismo, cuja consequência é um presidente/primeiro-ministro minoritário, constrange a ação de lideranças populistas. Não é à toa que Orbán aumentou o contingente de parlamentares eleitos pelo voto distrital —a Hungria usava um sistema híbrido— para fabricar uma maioria parlamentar.

O multipartidarismo levou Milei a barganhar com a casta política que tanto condenou. Dois dos sobrinhos de Carlos Menem, ex-governador de La Rioja, e presidente em dois mandatos, são peças-chave nas negociações de Milei para aprovar seu pacote radical de mudanças; um deles, Martín Menem, filho do senador Eduardo Menem, é o atual presidente da Câmara dos Deputados. A estrutura institucional acabou prevalecendo sem que o núcleo duro do pacote tenha sido abandonado.

Bolsonaro ascendeu rejeitando a velha política, mas se submeteu a ela quando sua agenda malograva e o impeachment entrou na pauta. O rapprochement com o centrão respondeu a este duplo imperativo de sobrevivência, como analisamos, em “Por que a democracia brasileira não morreu?”

Líderes iliberais à esquerda e à direita historicamente vilipendiaram a atividade parlamentar como farsa burguesa. A fórmula leninista “a república democrática é o melhor involucro possível para o capitalismo” só foi abandonada com relutância na tradição socialista.

Mas há coalizões e coalizões! Na Alemanha (NEPP = 5.5), as coalizões são montadas com base em acordos escritos, programáticos. Entre nós, muitos acordos foram “transações à vista”. A nossa extrema fragmentação partidária (NEPP = 16.4 em 2018, 9.9 em 2022) “domestica” presidentes iliberais, mas o custo é alto.


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