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Café da manhã histórico no Sobrado da Cidade é viagem no tempo imperdível no fim de semana carioca

Foto: Divulgação

Fui ao Café Imperial do Sobrado da Cidade, um verdadeiro evento de café da manhã servido aos sábados e domingos às 9h30h no restaurante da rua do Rosário, com um sortido cardápio do século XIX, adaptado às proporções e gostos dos dias de hoje. Ele é seguido por uma caminhada pela região da Praça XV com uma historiadora, ali nos arredores do que gostamos de chamar de Pequena Lisboa. O passeio de uma hora é agradável e instrutivo, terminando ao meio-dia em ponto na belíssima Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores, uma pérola carioca na rua do Ouvidor, construída em 1750 e repleta de histórias. Na Igreja, nossos lugares estavam reservados para assistir uma incrível Missa Solene em Latim, com direito a música erudita da melhor qualidade, celebrada com paramentos e acessórios litúrgicos que remetem ao passado.

Desde a música da procissão de entrada, até a bênção final com um inesquecível Aleluia de Handel, o Coral Astorga, com 15 músicos e grande orquestra, brinda os visitantes da linda igrejinha com momentos memoráveis, que só evidenciam a bonita liturgia utilizada pelos padres e Acólitos da Irmandade dos Mercadores. O gogó da soprano Juliana Sucupira é de arrepiar e é outro grande destaque, além da beleza estonteante do templo, vestido em fina renda e veludo vermelho, é coberto de flores, como num caprichado casamento.

Amo história, não é por acaso que a sede do DIÁRIO DO RIO fica no Arco do Teles; ao sentar naquele delicioso banquete que foi o Café da Manhã no Sobrado da Cidade na manhã de um domingo carioca fui transportado para o século XIX; e.. O que era aquela rabanada com calda de Vinho do Porto? Vale provar. E repetir. o próprio Sobrado, um prédio do período reformado recentemente, já nos traz ares imperiais, com sua rica fachada em azulejaríeis. Destaque também para os garçons vestidos como se fossem empregados de uma mansão do período vitoriano, servindo à mesa conforme a etiqueta vigente na época, e nós tendo que comer com pratos de porcelana e talheres que nunca usaríamos no nosso dia a dia, especialmente na primeira refeição do dia.

O menu é um show à parte, o menu que fica impresso está escrito em francês como cabia às boas famílias da época. Café, nada de Espresso, não teria como ser feito. Suco? Esqueça laranjas, não eram hábito de virar suco no Rio: caju e abacaxi. Queijo? Só o de Minas, e queijos europeus, como era preferência dos cariocas da elite. Salame? Só se for de javali, eram as carnes de caça que se usava como frios. Doces em compota, à vontade, como se vê até hoje nas fazendas. Uma coisa que não falta na mesa é goiaba, um doce tão brasileiro, mas tão brasileiro, que até hoje comemos e adoramos.

Mas me deixe falar mais do ponto alto deste café que dura uma hora e meia: a incrível rabanada com redução de Vinho do Porto! Eu tenho intolerância a glúten, não sou celíaco, ou seja, posso comer, mas devo evitar. Mas já o cheiro era delicioso e eu, que nem sou um grande fã de rabanada, caí dentro. Ela parecia um pudim por dentro, e o molho era divino.

Comi duas, e estou pagando os pecados ainda do deslumbre calórico que foi a parte gastronômica do Café Imperial: foram mais de 3 horas de tênis na segunda só para poder fazer quitar uma parte do “débito”.

A partir das 11 horas o café finaliza; chega a segunda parte deste passeio maravilhoso e é hora de conhecer um pouco do cenário do entorno do Sobrado da Cidade, que envolve a Rua dos Mercadores, Rua do Mercado, Praça XV, Travessa do Comércio e Rua do Ouvidor. Este local por onde andaram uma Rainha e um Rei de um Império da Europa – sem contar alguns dos maiores brasileiros da história, e tantas vezes despercebidos por nós cariocas em nossa pressa do dia a dia. Uma historiadora explica sobre a rotina dos escravos que construíram os prédios, e a história destes, o incêndio dos Arcos e a bruxa Bárbara dos Prazeres, o Convento do Carmo, onde faleceu a Rainha Dona Maria. Uma hora de história do Rio, Brasil e Portugal. Passa rápido, é muito interessante.

Decoração da Reabertura da Igreja da Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores – Foto Daniel Martins/DIÁRIO DO RIO

Finalmente, meio-dia em ponto, quando o sino badala 12 vezes na Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores (e mais algumas vezes por conta do Angelus que chama as pessoas para a missa do meio-dia), podemos entrar e assistir uma Missa como pouquíssimas em nossa cidade, talvez a única. Toda decorada com flores, um grande coral cantando música sacra, além do órgão de foles do século XVIII, volta a nos tirar do século XXI e nos levar duzentos anos atrás. Poderia dizer que é uma missa, para nós católicos é, mas na verdade também é um concerto. Afinal Sucupira conduz Aleluia de Handel, Ave Maria de Gounod, Zadok the Priest, Magnificat, entre outras belíssimas orações musicadas e eruditas que você não pagaria menos de R$ 100 para assistir, ainda mais num ambiente tão bonito. Isso tudo sai de graça, já que a missa – que tem o apoio cultural do restaurante, patrocinador do Coral e da Decoração em convênio com a Irmandade – também é aberta o público. Os lugares dos convidados são marcados, e o restante (mais da metade da Igreja) é ocupado por fiéis que frequentam o templo e por quem quer que queira assistir a Missa e o concerto. A igrejinha tem cerca de 100 lugares no total; aos sábados, o serviço religioso fica a cargo do padre greco-melquita Vítor Pereira, e aos domingos, do padre Victor Hugo Nascimento da Silva.

Poucos passeios fazem tão bem para o estômago, mente e alma – ao mesmo tempo – como o Café Imperial do Sobrado da Cidade. Os idealizadores do evento e a Irmandade dona da igreja tiveram uma grande ideia e que vai cair no gosto dos cariocas e dos turistas que visitarem nossa cidade; com certeza, vai se tornar parte do calendário turístico da cidade. O Rio de Janeiro vai muito além de suas belezas naturais, mas também tem suas histórias e particularidades, tão bem aproveitadas neste programa que alia gastronomia, cultura e fé.


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