Turismo

Arquipélago de Alcatrazes proporciona divertida aventura de mergulho em SP

Assim que os primeiros raios de sol aparecem, pelo menos duas dezenas de pessoas sonolentas já esperavam a chegada do barco Capitão Ximango ao porto do Perequê. É dali que, a cada duas semanas (ou quando o clima permite), a embarcação parte rumo a Alcatrazes, arquipélago a cerca de 35 km da costa do litoral norte de São Paulo.

Mesmo tão pertinho, o local tem uma aura de mistério porque, até 2016, só a Marinha podia ir até lá. Nos anos 1980, os militares escolheram as ilhas como alvo de exercícios de tiro por considerá-las menos relevantes em termos de biodiversidade do que Abrolhos, na Bahia, e Fernando de Noronha, em Pernambuco.

Mas mesmo sem corais coloridos, águas azul-turquesa ou praias de areia branca, Alcatrazes abriga muita vida. No fim da última era glacial, o aumento o nível do mar separou aquelas terras do continente, e muitas espécies que já estavam por lá continuaram evoluindo de um jeito muito particular. Tanto que há quem chame o lugar de “Galápagos brasileira”, em referência ao arquipélago equatoriano famoso pelas explorações de Darwin.

Entre as mais de mil espécies que vivem em Alcatrazes hoje, pelo menos duas dezenas são endêmicas, como a jararaca-de-alcatrazes, a perereca-de-alcatrazes, uma espécie de rã e outra de bromélia.

Há ainda cerca de cem espécies de aves marinhas, como fragatas, atobás e trinta-réis, que formam ali o maior ninhal do tipo no Atlântico sul. Embaixo d’água, então, nem se fala.

Durante as décadas de treino de batalha naval, muitas organizações pediam o fim dos exercícios militares. Em 2016, um decreto do então presidente Michel Temer reconheceu o arquipélago como um refúgio de vida silvestre. A visitação turística começou no final de 2018.

Saem os exercícios da Marinha, entra o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Saem os navios e entram pequenas embarcações cheias de mergulhadores curiosos para ver o que, por tanto tempo, pouca gente podia ver.

TODOS A BORDO

O barco parte num clima geral de ansiedade. Todos estavam ali de última hora, uma vez que as vagas para as saídas regulares já estavam esgotadas —o passeio sem mergulho sai por R$ 550 e o completo, por R$ 920 (para mergulhadores certificados) ou R$ 1.400 (com instrutor). Havia ainda a possibilidade de avistar baleias e golfinhos, que viajam anualmente até Abrolhos para se reproduzir e nessa, cruzam a rota até Alcatrazes.

“Depois de oito anos da abertura do refúgio, vemos o resultado dos esforços de conservação”, afirma Tome Nishioka, condutora subaquática e sócia da agência especializada em mergulhos Rosa do Mar, que já tem lista de espera até o fim do ano. “Há notícias de cardumes de tubarão, e também uma temporada de baleias muito boa. Tudo isso ajuda a aumentar a curiosidade por Alcatrazes.”

A saída extra foi organizada devido a uma combinação de fatores não muito comum: a ausência de frentes frias, que deixou o céu limpo, sem chance de chuva, e o mar calmo, com ondulações mínimas. O clima ideal para visitar o arquipélago.

Quando o barco zarpa, é hora do café da manhã, com pães, frios, bolos e sucos. Cerca de 40 minutos mar adentro, gritos de “olha lá!” chamam a atenção para uma baleia jubarte se arqueando a poucos metros da embarcação. Foi a única durante todo o passeio, mas muito mais eficiente que o café para acordar a galera.

Três horas depois (ou 1h30, se você for de lancha), o que era só uma silhueta no horizonte começa a se erguer em frente ao barco. Há a ilha principal, com 2,5 km de extensão, outras quatro menores e alguns pequenos rochedos.

Na chegada, o barco contorna todo o arquipélago, revelando toda a sua exuberância e também os alvos e marcas de tiros deixados pela Marinha. No lado de fora da ilha, aquele voltado ao oceano, um cardume de tubarões rodeia o barco com seu nado ágil e esguio —um daqueles momentos em que o olho humano se prova superior a qualquer câmera.

Alcatrazes não tem praia e, ainda que tivesse, aportar é proibido. No Portinho, uma enseada virada para o continente e considerada um ponto de mergulho mais seguro, o barco enfim desliga os motores, e logo fica vazio. Finalmente, é hora de mergulhar.

SOB A SUPERFÍCIE

Os paredões que vemos sobre a superfície se estendem por muitos metros abaixo dela, onde grandes rochas, absolutamente gigantescas, se empilham umas sobre as outras. A água esfria ainda mais com a profundidade que, para quem consegue lidar com a aflição de mergulhar tão fundo, pode beirar os 20 metros.

A visibilidade embaxo d’água naquele dia não era das melhores, disseram os instrutores. Mas mesmo assim foi possível observar estrelas-do-mar, ouriços, peixes multicoloridos e até grandes cardumes —tão numerosos quanto as centenas de aves que sobrevoam o arquipélago. Nada tão exuberante como em Noronha, mas certamente muito mais abundante do que geralmente se espera

das águas do litoral paulista.

Depois de algumas horas, todos retornam ao convés para o almoço, que é preparado no próprio barco enquanto a galera está na água. São servidos arroz, feijão, legumes variados e frango, além de sucos e refrigerantes. Logo em seguida, um café da tarde com biscoitos e petiscos fica à disposição até o fim do passeio.

À tarde, há um segundo mergulho em outro ponto da ilha. Os menos experientes ficam nos arredores da embarcação, enquanto os que têm mais autonomia aproveitam para nadar mais longe. No retorno, eles relatam a sorte de ter avistado tartarugas e outros tubarões —arredios às bolhas de ar que a nossa respiração cria na água, eles são mais difíceis de ver.

Quando os lábios já parecem ressecados pelo sal e o cansaço começa a bater mais forte, é hora de voltar. Visto de Alcatrazes, o continente parece só uma linha mais escura no horizonte. Até lá, são mais três horas de viagem. Desta vez, embaladas pelos relatos e trocas de fotos da aventura, um belo pôr-do-sol em meio ao Atlântico e, para alguns, por uma boa soneca em alto mar.

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